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NOIVADO NO SERTÃO
Ledinha me fez o convite para o noivado do irmão no interior de Minas Gerais, lá para os lados do Triângulo. Fomos colegas de faculdade e nos tornamos amigas.  Louca por viagens eu topei tal programa.  

O noivado estava marcado para 20 de dezembro, vésperas de Natal, período de férias.

Ônibus direto para a cidadezinha do noivado não havia. Era necessário tomar um ônibus até Belo Horizonte depois para Patos de Minas depois para Carmo. Para Belo Horizonte havia ainda passagens à venda. De Belo Horizonte para Patos a coisa complicou. Outra opção seria viajar até São João Del Rey depois de lá para Lavras e depois até Patos. De Patos de Minas rumaríamos para Carmo. O trajeto de Juiz de Fora até Carmo feito de carro, passando por Lavras, levaria sete horas e meia perfazendo um total de 588 km, já por ônibus, eu não fazia ideia.

Decidimos rumar para São João Del Rey por ônibus. Viagem tranquila. Adquirimos as passagens para Lavras e ficamos na rodoviária aguardando o embarque durante duas horas. Tivemos tempo para comer, usar o banheiro e dar uma volta rápida pela cidade. Compramos umas bolachas, água mineral e revistas. Pensávamos chegar a Lavras por volta das duas horas da tarde e encontrar passagens para Patos de Minas naquele mesmo dia. Embarcamos e nos acomodamos em nossas poltronas, em lugares separados no fundo do ônibus.

Conseguimos chegar no horário previsto, porém não encontramos mais horário de ônibus para Patos de Minas naquele dia. Decidimos tomar um ônibus para Campo Belo. O que desconhecíamos era o fato de que o ônibus é um Parador, apelidado Cata-cata. Os lugares estavam todos ocupados a assim nos acomodamos em pé no fundo do carro apoiando as bolsas no chão. Chegando a Campo Belo, soubemos que poderíamos seguir para São Gotardo e de lá para Carmo sem passar por Patos de Minas. Passaríamos por Formiga e de lá tomaríamos um ônibus fazendo o percurso de três horas mais ou menos. Assim fizemos.

Conseguimos comprar as últimas poltronas e procuramos dormir um pouco, pois não sabíamos como e onde passar a noite caso chegássemos a São Gotardo muito tarde e não haver ônibus e passagens para Carmo. A bagagem dos passageiros era uma coleção de caixas de papelão, latas, bolsas com mantimentos, um aparelho de televisão e um saco com dois leitõezinhos que guincharam o tempo todo.

O cansaço era imenso, mas o choro dos porquinhos pouco atrapalhou nosso sono. Acordamos no meio do caminho com o alvoroço de passageiros. O ônibus tinha enguiçado. Nem reza forte fez a embreagem ou a caixa de marcha funcionar.

A cidadezinha mais próxima era Bambuí. Sentamos todos à margem da estrada. Estava um tempo quente e abafado. Esperamos horas, quando um caminhoneiro passou e ofereceu levar o recado do motorista do ônibus e carona para quem quisesse ficar em Bambuí. Achamos por bem aceitar a carona e nos aboletamos na carroceria do pequeno caminhão. Já era noite quando chegamos à cidadezinha. O caminhoneiro disse que conhecia alguém que poderia levar os passageiros até São Gotardo. Perguntamos se seria possível nos levar até Carmo. O próprio caminhoneiro se ofereceu para nos levar porque também estava indo para lá. Aceitamos agradecidas. Uma grávida pediu carona também e Ledinha cedeu seu lugar de carona para a grávida, acomodando-se na carroceria e eu solidária fui juntar-me a ela. Sentamos sobre umas lonas dobradas e seguimos viagem. A noite avançava. O céu estava muito bonito com suas estrelas e nenhuma nuvem. A lua devia estar em sua fase de Nova porque não deu o ar de sua presença. Resolvemos cantar ‘O luar do sertão’. Interrompemos o canto ao nos lembrarmos dos porquinhos e imaginar o destino que teriam em algum forno por ocasião do Natal.

Após alguns sacolejos chegamos a Carmo. Descemos na Praça da Igreja e nos despedimos do caminhoneiro. A grávida prosseguiu viagem.

Andamos em direção a casa e vimos a luz da varanda acesa. Havia gente no portão. Fomos recebidas com festas pelo rapaz preocupado com nossa demora. Ele era o noivo e irmão de Ledinha. Entramos e rumamos para o quarto evitando fazer barulho porque havia uma pessoa deitada numa das camas. Deixamos nossas sacolas no chão e fomos para a cozinha. Uma enorme mesa continha as iguarias preparadas para o almoço de festa do dia seguinte. Depois do rápido banho frio e de um café com broa fomos dormir.

No outro dia, um sábado, nos juntamos aos parentes e convidados já chegados para a festa.
Depois de servido o almoço, farto e variado, todos caminharam para a missa na igreja da praça. De noite teria o baile do noivado.

O dia passou rápido comparado com a aventura da viagem. Durante o baile os noivos trocaram as alianças e o forró rolou animado até a manhã raiar. O domingo foi de conversas e muitas risadas com os causos do sertão mineiro.

Retornamos na segunda-feira fazendo o trajeto por Patos de Minas até Belo Horizonte. Com sorte, conseguimos passagens para Patos e embarcamos; também em Patos de Minas não houve dificuldade para encontrar passagens para Belo Horizonte embora em poltronas separadas e no fundo do carro.

Ledinha decidiu ficar em Belo Horizonte, mas eu precisava voltar para casa. Chateada por ter de retornar sem a sua companhia, eu me despedi da amiga e me dirigi ao guichê para comprar o bilhete de viagem. Para minha maior chateação só havia horário mais tarde. Comprei o bilhete, depois uma revista de palavras cruzadas e saí para beber um café de gosto duvidoso. Sentei-me num banco aguardando a hora do embarque. Estava com dor de cabeça, mas tive a ideia de voltar ao guichê e verificar se houvera alguma desistência e antecipar a volta. Por sorte alguém desistiu e troquei a passagem. Embarquei e após mais de três horas de viagem cheguei ao destino.

Em casa, depois de um longo banho, dormi. No dia seguinte eu viajaria com minha família para passar o Natal na fazenda de uns tios. Passado o dia de Natal eu preferi permanecer na roça para o Ano Novo mesmo sem a família que viajou ao Rio de Janeiro para assistir a queima de fogos de Copacabana.

Que deliciosos dias de descanso, de comer fruta no pé, de pescar lambaris no riacho, de sentir o cheiro de curral que eu adorava e de ficar sentada ao lado do fogão de lenha!

O descanso na roça chegou ao fim. Voltando a casa encontrei o recado de Ledinha. Ainda estava chateada com ela. Ela me abandonara na rodoviária de Belo Horizonte por isso não telefonei de volta. Dias depois Ledinha tornou a telefonar e contou que seu irmão desfizera o noivado. Eu nem perguntei o porquê. Tomei a decisão de a partir desta data não mais comparecer a noivados ou casamentos.
Pensava com meus botões: - Pra quê? Viagem perdida. Uma canseira danada pra nada!

daguinaga
Enviado por daguinaga em 22/01/2010
Alterado em 29/08/2014
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